A FREGUESIA DE SÃO PEDRO SEGUNDO RUDOLPH PARREIRA
O escritor e diplomata mineiro João Guimarães Rosa, autor de uma das mais importantes obras literárias da língua portuguesa, Grandes Sertões – Veredas, atribuía o seu talento às narrativas que coletava nos cantos de Minas Gerais, vindas de gente simples e carregadas de humor e mistério. Com novas palavras, neologismos para as presentes na língua culta, Rosa abriu caminho para o chamado ato de escrever falando. É como se os narradores fossem e de fato são seus personagens, com suas vivências, seus humores – muitas vezes pela ausência destes – e seus temores.
Outro mineiro, nascido em Uberlândia, Rudolph Parreira, tem seguido com elegância esta trilha. Bom ouvinte, vai coletando histórias por onde passa. Filho de militar que mudou de cidade em cidade e também de país, vivendo em Lisboa, ele acabou por desenvolver o dom de Rosa de escrever falando.
O último livro, resultado desta sofisticada técnica, é “A fabulosa Freguesia de São Pedro”, e será lançado neste domingo, dia 10 de julho de 2022, no Bar Ópera, à sombra da mais famosa sibipiruna da Freguesia de São Pedro do Uberabinha, hoje Uberlândia, na praça Adolfo Fonseca, número 14.
Neste livro, o escritor, redator e roteirista publicitário desde 1992, com passagem destacada pela música como cantor, compositor, violonista, violeiro e contrabaixista desde 1989, reúne histórias bem humoradas, por vezes cáusticas, dos moradores do lugar. Passeia por bairros, ruas e avenidas trazendo com frescor os destemores e temores de homens, mulheres e crianças que, no dia a dia, vão transformando o antigo arraial, depois freguesia na hoje segunda cidade mineira em densidade populacional.
Rudolph Parreira dá sequência, assim, ao seu primeiro livro, “A ilha de Santo Amaro – crônicas cotidianas”, resultado da coleta do falar do outro e da escrita de si dos moradores do Guarujá, onde morou. É que bom ouvinte, Rudolph valoriza tudo o que escuta em todos lugares e vai traçando os perfis destes falantes, transformando essas impressões soltas, este pensar que se exprime em palavras, em literatura.
O resultado são contos, verdadeiras crônicas cotidianas de um lugar, com uma pitada generosa de humor porque a formação profissional em agências de publicidade o emprestou o dom de sintetizar pensamentos em forma de frases curtas que resultam em imagens potentes enquanto narrativas.
É assim, palavra por palavra, que ele vai apresentando os personagens desta freguesia de São Pedro, onde muitas são as desigualdades que formam, em sua diversidade, o perfil dos moradores que se envolvem em situações inusitadas em lugares que podem ser mapeados e que trazem também uma carga de informação, de emoção para quem lê, viveu, vive ou quer conhecer Uberlândia, a grande freguesia de São Pedro, a exuberante cidade dos sertão da farinha podre quando a expressão do bioma cerrado era pouco usada por desbravadores. O lugar que rapidamente deixou o legado de arraial, tornando-se freguesia e crescendo nos arredores da Fazenda São Francisco que, apesar do nome, expulsou os animais e pássaros dando lugar a outros, os falantes que são a essência da escrita de Rudolph.
Rosa, o mineiro genial, está presente em cada palavra que encanta e a cada legado das gentes das Gerais porque, afinal, nenhum de nós morre, como ele escreveu, apenas ficamos encantados e continuamos encantando a cada narrativa de nossas vidas, a cada lembrança que deixamos e que se perpetua no outro. A literatura tem mesmo esse dom de trazer para o presente o ausente e Rudolph cumpre, assim, um belo papel na vida cultural da Freguesia de São Pedro; do Uberabinha, diga-se.