FIGUEIRÓ: UM SÉCULO DE JORNALISMO

Wilson Figueiredo, o “Figueiró”, apelido que ganhou do escritor Mário de Andrade (1893-1945), fechou os olhos pela última vez longe das redações barulhentas que tanto amara. Capixaba nascido na pequena Castelo em 29 de julho de 1924, mineiro de coração e carioca por opção, Figueiró durante quase 50 anos foi a alma do Jornal do Brasil. Homem de letras afiadas e convicções inquebrantáveis viu a história passar diante dos olhos atentos, críticos e ternos e a registrou até que, enfim, como diria o mineiro João Guimarães Rosa, ficou encantado depois de muito encantar com seu talento, carinho, respeito e estímulo às diferentes gerações de jornalistas e escritores com os quais trabalhou e ajudou a moldar.
Figueiró, com quem convivemos na redação do Jornal do Brasil, na Avenida Brasil, 500, foi um dos últimos “mineiros” daquela geração formada por Fernando Sabino, Otto Lara Rezende, Paulo Mendes Campos, Sabato Magaldi e Hélio Pellegrino que acreditava nas palavras como armas, nas reportagens como crônicas de um país em eterna ebulição e na literatura como alimento para o espírito.
O homem que cobriu ditaduras, entrevistou presidentes, escreveu livros que atravessaram décadas sem perder o fôlego, deixa importante legado. O primeiro livro, A Mecânica do Azul” (1946), por exemplo, tem capa de Burle Marx e apresentação de Tristão de Athayde. Uma obra que marcou o seu círculo de amigos como Fernando Sabino que a cita na obra “Jogo de Damas”.
Sua pena era certeira, seu humor ácido, se faz presente também na trilogia que publicou pela Editora Gryphus: “1964: o último ato” (2015), “De Lula a Lula” (2016) e “Os mineiros: modernistas, sucessores & avulsos” (2018). Figueiró, em toda a sua trajetória nunca ficou temeroso diante do silêncio que às vezes cai sobre os homens que dizem verdades incômodas, sempre soube que a verdade como no texto bíblico atribuído a João nos liberta e liberta a todos.
Morreu como viveu: discreto, elegante e sem pompas, mas deixando atrás de si um rastro de tinta e papel que não se apagará. Seu nome amanhã não estampará manchetes — o mundo agora é outro, mais rápido, mais efêmero—mas ele e a sua obra ficarão na memória dos que ainda sabem que jornalismo já foi literatura, e que literatura, quando feita jornalismo, é também um ato de resistência. Talvez, o papa Francisco que nos deixa no mesmo dia necessitasse de levar consigo um brilhante e tolerante redator. E lá se foi o Figueiró.
Como outro grande nome da literatura e do jornalismo, o tricolor Nelson Rodrigues escreveu “Geralmente, nós jornalistas modernos, temos a mania da objetividade, por isso, não enxergamos nada, somos cegos para as evidências mais ululantes. O Wilson não. É poeta e, como tal, está sempre a um milímetro de delírio”.
Siga em paz, mestre Figueiró ao encontro de Loudes com quem teve os filhos Pedro, Rodrigo, Vanessa e Andrea.